A passarela de Hilneth

A maior casa destinada a apresentações artísticas em Natal, o Teatro Alberto Maranhão (TAM) é uma instituição pública com 106 anos de existência. Apesar de ser mantido pela Fundação José Augusto (FJA), artistas e produtores locais reclamam da falta de iniciativas na promoção das artes cênicas potiguar. Além disso, eles acusam a direção da instituição de prestigiar peças e atrações de outros estados, em detrimento das produções locais, o que dificulta o fomento das artes cênicas no Rio Grande do Norte. 


Entre os insatisfeitos com a atual situação do teatro está o dramaturgo Marcelo Charles, do Grupo Ditirambo de Teatro. Ele contou que entre os anos de 2004 e 2005, o TAM chegou a realizar algumas oficinas de montagem e incentivos para o teatro local, mas que depois disso nunca ouviu nenhum outro projeto ou incentivo por parte da direção de teatro. “Há dois anos, não vejo nenhuma iniciativa de promoção do teatro potiguar realizado no TAM”, disse.


Outro ponto que ele citou é a falta de prestígio que os artistas locais têm na hora de marcar uma pauta. Charles reclama que a agenda do teatro é fechada, dando prioridade para as atrações nacionais em detrimento dos espetáculos de dança e teatro locais. “Normalmente eles deixam os dias como segunda e terça-feira para os artistas potiguares”, disse o dramaturgo.


A suposta falta de prestígio não dispensa nem mesmo a própria Escola de Dança do Teatro Alberto Maranhão. Os próprios diretores da escola têm dificuldades em conseguir marcar os espetáculos dos seus artistas. Eles precisam agendar com antecedência para evitar que nenhuma companhia de fora se apresente na mesma data que a eles. “Caso isso não aconteça, não conseguimos marcar as apresentações”, disse a diretora artística do Editam Wanie de Rose


Wanie de Rose conta que o Grupo de Dança do Teatro Alberto Maranhão já chegou a ter sua pauta trocada a pedido da direção em uma ocasião. “Eles chegam e perguntam se não seria apresentar em outro dia, porque tem uma peça nacional”, disse. A diretora ressalta que a maioria das apresentações da Edtam acontece na segunda-feira já por causa desse problema. “Conseguir final de semana lá é difícil, sempre tem gente de fora”, disse.


A Escola de Dança possui hoje cerca de 650 alunos entre 14 e 18 anos. Apesar de levar o mesmo nome do teatro, ela é mantida pelos alunos, que pagam uma mensalidade de R$ 15 por mês para manter os professores e a manutenção do prédio. “O TAM ajuda em algumas viagens e no pagamento de bolsas, mas nem sempre”, disse. Wanie conta que no ano passado teve que diminuir seu número de apresentações por causa da escolha da pauta do Teatro Alberto Maranhão. “Tínhamos quatro apresentações planejadas, mas tivemos que diminuir para três”, explica.


Wanie contou ainda que a diretora do TAM, Hilneth Correia, chegou a sugerir que as crianças se apresentassem no Hotel Vila do Mar, em um local, segundo ela, que não era apropriado para o aprendizado dos alunos. “Não gostei disso e bati o pé para que as crianças pudessem se apresentar no Teatro”, conta. Outra dificuldade, segundo ela, é a de marcar pautas para o domingo. “Todo domingo tem uma apresentação infantil, nunca conseguimos produzir nada”, disse.


A produtora do grupo Gira Dança, Tatiane Fernandes, concorda que falta prestigio aos grupos potiguares junto à administração do teatro. “A gestão do TAM não busca atender o artista potiguar.”, disse. No entanto, ela não teve nenhum problema com as suas apresentações no teatro, com exceção dos domingos, dia destinado a uma programação infantil. “Acho que falta também um pouco de profissionalismo por parte de alguns grupos de teatro e dança”.


Tatiane cita o fator comercial como determinante para a escolha das peças teatrais e espetáculos de dança. “É preciso uma curadoria, não há um padrão de qualidade daquilo que o teatro vai apresentar”, conta. Outro ponto que ela cita como falho no teatro é a falta de acessibilidade para portadores de deficiência física. Para ela, a luta agora é por outro espaço público para apresentações. “Natal precisa de mais um teatro”, afirma.


Diretora garante há espaço para os artistas locais



Durante todo ano passado, o Teatro Alberto Maranhão realizou ao todo 382 eventos. Mais de 160 mil pessoas sentaram nas cadeiras do TAM. Hilneth Correia é diretora do Teatro Alberto Maranhão desde 2003. A instituição é vinculada ao Governo do Estado, respon-sável por arcar com a maior parte dos custos da instituição. “O dinheiro que entra aqui usamos para pequenas reformas e para o pagamento de alguns funcionários”, disse Hilneth.


A diretora disse que a instituição não recebe uma verba fixa do Governo para se manter mensalmente. “Eu apresento projetos, levo para eles, que aprovam e liberam o dinheiro”, conta. O único projeto em andamento realizado pelo teatro é o Ribeira das Artes. “Uma feira multicultural que fazemos nos domingos por meio de parceri-as”, disse.


Sobre as críticas, Hilneth rebate. Ela afirma que “há sim espaço para os grupos natalenses”, mas que faltam produtores trabalhando junto com esses grupos. “A maioria dos produtores locais só trazem atrações nacionais porque é mais rentável”, disse.


Sobre projetos de fomento ao teatro potiguar, Hilneth afirmou que procura fazer isso acolhendo iniciativas como o circuito Banco do Brasil e peças do eixo Rio-São Paulo. “É bom termos esse tipo de eventos para gerar um intercâmbio com os artistas locais”, disse. Quando questionada sobre o excesso de peças de comédia na cidade, ela se limitou a dizer que “dá público e desmitifica o teatro”.


Com relação a denúncias de que houve mudanças de pautas marcadas da Editam, Hilneth minimiza. “Aconteceu umas três vezes, só mudamos porque havia alguma atração forte. Numa delas, inclusive, foi o Circuito Banco do Brasil”, disse. A diretora do TAM revelou na entrevista que o trabalho de dirigir a casa é muito árduo. “È complicado, tenho que administrar egos”.


Questionada sobre a falta de uma curadoria para escolher as peças, ela afirma que não há perspectivas. “Não dá para falar sobre o futuro, nem sei quanto tempo vou ficar aqui”, disse.


Publicada no NOVO JORNAL de domingo (28/02)

2 comentários:

  1. Não acho que é justificativa, mas não dá pra deixar de atentar pra os seguintes fatores:

    Pouco público + falta de incentivos
    = Espetáculos produzidos em pequenos espaços, para pequenos espaços e e público restrito.

    Na grande maioria dos casos, espaços como a Casa da Ribeira, Nalva Café, TCP, Centro Experimental, Barracão dos Clowns, Sandoval Wanderley (na época que funcionava, é claro), Parque das Dunas dão conta muito bem.

    Depois de ler seu texto, chego à conclusão que o problema é estrutural mesmo, e não da gestão do TAM.

    [Ficou confuso, mas foi bastante esclarecedor para mim]

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  2. Diana, entendo seu ponto de vista, mas há sim público para o espetáculos potiguares no TAM. É tmbém o único teatr da cidade, há espetáculos que 'devem' ser feitos lá, independendo um pouco da quantidade de público. O descaso com o artista potiguar, pelo TAM, é imenso, desmarcar uma pauta com 20 bailarinos para atender um monólogo de "nível nacional"? seria cômico, se não fosse trágico.

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